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AQUECIMENTO: NEVE DO INVERNO NÃO COMPENSA

DESABAMENTO DE GELEIRAS

A parede de gelo anda mais ou menos dois metros por dia. Por isso, os cientistas dizem que as geleiras têm tempo de vida.

  Nossa aventura continua pela água a bordo do cruzeiro do capitão Lindstrom. Seguimos pela costa da Península de Kenai, ao fim da cadeia vulcânica submersa das ilhas Aleutas. O objetivo é atingir a ponta noroeste do campo de gelo de Harding, um dos maiores da América do Norte.

É um litoral erguido por vulcões e escavado pela ação das geleiras. O encontro com o mar é duro e pontiagudo. No local não tem praia, mas há esperança de banho de sol. Os leões marinhos se amontoam para economizar energia.

As aves fazem fila, mas em um dia frio ninguém vai para a água. Só quem tem barco encara a lotação: uma colônia inteira de gaivotas se mantém sobre um bloco de gelo; ou então nasceu para nadar graciosamente, como os golfinhos e as orcas. Um grupo grande aparece, mas grande mesmo é ela: o borrifo indica a presença de uma baleia jubarte, uma chaleira quente no meio das águas geladas.

Elas acenam levantando a nadadeira e saem de cena com uma rápida aparição da cauda. As primeiras geleiras aparecem: as alpinas, formadas no alto das montanhas, e as de vale, que acabam no mar.

No fundo deste mesmo fiorde, chegamos ao nosso destino: estamos diante da geleira noroeste. O gelo cobre a rocha como sorvete sobre um bolo de chocolate. Beleza e paz desabam aos poucos - ou aos montes. Mas até isso é natural. Ou quase.

As geleiras se formam sempre que a queda de neve supera o derretimento. O acúmulo acontece primeiro nas partes superiores das montanhas. O peso comprime as camadas mais profundas. Sob pressão, a neve compactada se transforma em gelo glacial. A força da gravidade puxa a geleira para altitudes menores. Lentamente, ela se desliza montanha abaixo como um imenso rio congelado. Ao chegar ao ponto de ruptura, o gelo se quebra. Ocorrem, então, os desabamentos.

Da parte mais alta, em direção à água, o gelo se quebra em fatias gigantescas. As ranhuras vão ficando mais profundas à medida que as placas se descolam uma das outras e se tornam torres pontiagudas. Terminam em uma muralha azul de 50 metros de altura.

A parede de gelo anda mais ou menos dois metros por dia. Por isso, os cientistas dizem que as geleiras têm tempo de vida. Desde que a neve cai no topo da montanha até o desabamento se passam de 100 a 200 anos. Na verdade, não é um fim, mas uma transformação que acontece bem na frente dos nossos olhos: o que um dia já foi um floquinho de neve está virando uma gotinha de mar.

O problema é que 99% das geleiras do Alasca estão diminuindo de tamanho. A queda de neve nos meses frios não está compensando os desabamentos do verão. É uma beleza trágica, diz Karla Schumacher.

Allen, o marido dela, acha que experimentou sentimentos antagônicos: o encantamento de uma paisagem tão bonita e a preocupação com a fragilidade dela diante do aquecimento global.

Uma bióloga mostra um pedaço de gelo colhido no mar. Explica que, quanto mais velho o bloco, mais claro o gelo. O que ela segura tem de 100 a 300 anos. Tomara que o lugar de onde ele veio dure muito mais

FONTE:GLOBO REPÓRTER